quinta-feira, 30 de julho de 2015

Mostra Marginal de Curtas exibirá curta sobre Pagu e mini-doc atual


Nesse sábado, 01/08, a Mostra Marginal de Curtas no Sarau Carolina (organizada pela Companhia Bueiro Aberto em parceria com o Jornal Dialética) mantém sua programação mensal e sua tradição de exibir obras clássicas e atuais. O primeiro curta a ser exibido (Eh, Pagu eh!) é de 1982 e o segundo (Solidão) é de 2008.


EH, PAGU, EH!

Escritora, militante, antropofágica, revolucionária, são alguns dos adjetivos usados no curta "Eh, Pagu, eh!" para descrever umas das figuras mais impactantes da cultura brasileira, Patrícia Galvão, a Pagu. Desde muito cedo, ela não aceitou seguir os padrões impostos pela sociedade, se juntou com modernistas e propôs uma nova estética literária, participando de debates, escrevendo uma literatura combativa. Mas não foi apenas na escrita que ela se atreveu a criar, percorreu o teatro, o jornalismo, a crítica de arte, se aventurou pela vida política. Apesar de não participar da Semana de 22, quando só tinha 12 anos, suas ideias foram fundamentais na construção da proposta do movimento modernista brasileiro.

Como militante do PCB, se envolveu em greves e manifestações, sendo presa mais de uma vez pela ditadura vargas, torturada, perseguida, rompeu com o PCB, mas se manteve na militância política, sobretudo na defesa dos pressupostos feministas. Mulher, artista e lutadora, Pagu foi capaz de sonhar com outra sociedade, sempre de forma explosiva, visceral, na ousadia que marcou sua trajetória, rompendo preconceitos e ultrapassando barreiras

Casou-se com o também modernista Oswald Andrade, com quem teve uma relação intensa entre altos e baixos.

No estilo documentário, mas com passagens pela ficção, vemos a vida e obra da autora num filme que não se pretende jornalístico e somente informativo, a narração dos acontecimentos, o acervo de arquivos, a encenação são um mergulho pelo furacão Pagu, seus extremos, sua utopia, sua arte.

Nada tão propício para o Sarau Carolina do que relembrar pelo cinema uma artista desse porte.  O nome "Eh, pagu, eh!" é inspirado no poema de Raul Bopp:

Pagú tem uns olhos moles
uns olhos de fazer doer.

Bate-coco quando passa.
Coração pega a bater.
Eh Pagú eh!
Dói porque é bom de fazer doer 


DIREÇÃO: Ivo Bueno
ANO DE PRODUÇÃO: 1982 
DURAÇÃO: 15 min.


SOLIDÃO

"Solidão" é um curta contemporâneo que adentra as perspectivas de um jovem anônimo sobre a existência, a morte, o universo... Um indivíduo que não tem nada de especial e por isso mesmo tem tudo, sua singularidade. É incrível como através do depoimento espontâneo percorremos temas tão profundos para o pensamento humano. Por trás de todas as divagações advindas da conversa, mora a solidão do personagem, consigo mesmo ele tem sua concepção sobre o mundo que aí está. Na verdade, existe um mundo dentro dele, desvendado pelo cineasta. A solidão dele reflete a solidão social que está tão presente nos tempos atuais.

A fotografia parece confusa, mas é justamente essa confusão que expõe a coerência dos planos, boa parte detalhes do corpo e da cidade, exemplo do rosto visto pela metade. É como se a câmera fosse lá dentro do mundo criado pelo jovem, propondo a experimentação que vai se fazendo até construir a unidade cinematográfica. Soma-se isso à trilha sonora frenética e instigante que em nenhum momento cessa de tocar.

Podemos pensar: o que levou o diretor (que é também roteirista, câmera e editor) a procurar esse menino? Nos últimos anos, o documentário brasileiro tem tomado novos contornos, se abrindo para temáticas não tão lógicas e fechadas, com entrevistados que não são necessariamente autoridades nesse ou naquele assunto. Em certas obras, a pessoa que fala não é tão real quanto parece, é um ator interpretando seu papel, o que ocasiona interessante mistura entre ficção e documentário. Seria o entrevistado de "Solidão" um ator, não saberemos, nos deparamos com o monólogo de um estranho e solitário personagem. Comum e louco, visionário e normal.

DIREÇÃO: Ciro Maccord
ANO DE PRODUÇÃO: 2008
DURAÇÃO: 5 min.






Frase da revolucionária Patrícia Galvão, sua posição política é enfatizada no curta de "Ivo Bueno"




Trecho do curta "Solidão", a fotografia de planos detalhes se encaixou muito bem na proposta de retratar a solidão de um jovem

segunda-feira, 20 de julho de 2015

"Numa roda de choro" terá exibição no Espaço Garrincha nesse sábado


Do nossa relação com as diversas manifestações culturais da periferia, nas quais participamos, veio a ideia de começar a retratá-las no cinema. Além de um filme experimental sobre samba (Bamba de Vila, já lançado), fizemos um sobre viola caipira e nordestina, mais trabalhado (Viola Urbana, em processo de montagem) e outro sobre choro. "Numa Roda de Choro" terá exibição esse sábado no Espaço Cultural Mané Garrincha, em Sp.

O filme surgiu do contato com Luis Macambira, pertencente a uma tradicional família de choro, há anos ele usa seu quintal para reunir artistas populares numa roda descompromissada. Diversos clássicos do choro e do samba são relembrados entre cervejas, petiscos, risadas, discussões. São amigos que gostam de música boa. E isso é o que os move.

Antes a roda era composta pela velha guarda da família Macambira: os tios de Luis, que tocaram com grandes nomes da música brasileira como Arauto Santos e Paulo Vanzollini, costumavam juntar artistas de peso no seu quintal. A nova geração não deixou de lado e assumiu o posto, outros nomes passaram a marcar presença e mantém viva a roda que ocorre praticamente toda semana no bairro Inocoop, cidade de Guarulhos, grande SP.




Roda de choro na casa de Luis Macambira em 2002


Quando chegamos para as filmagens, trazíamos na bagagem, além do gosto pela cultura da quebrada, as referências do cinema novo, sobretudo de Leon Hirszman, que fez diversos filmes sobre cultura popular, a câmera na mão foi nossa proposta estética principal, a lente estaria lá dentro da roda, como mais uma participante do processo.

Luis Macambira, com seu gênio forte, já saiu dizendo "- Pode filmar essa bagaça que aqui é nóis, música boa é o que não falta!" E já mandou descer uma cerveja pra equipe, apresentou um cara do bandolim: "- Esse é bom!", tomou uma dose de cachaça e relembrou histórias dos discos gravados pelos seus antepassados. Depois nos alertou " - Quero ver o que você vai editar, vê cê não coloca todas as merdas que a gente fala!" Após algumas gargalhadas, expliquei que o roteiro era livre, entraríamos na roda, às vezes com algumas perguntas, mas dispostos a filmar o que fosse acontecer e que não precisava se conter, o filme pedia a liberdade daquele encontro. Estávamos em casa e tínhamos a certeza de que ali se unia a música e o cinema.

Gravamos 8 horas de arquivos que viraram 32 minutos. Para nossa grata surpresa, além das peças de variados compositores, a roda virou um acirrado debate acerca da identidade cultural brasileira, as influências que permeiam nossa música, a relação com o processo histórico, a mídia... Enquanto a cerveja continuava na mesa e a alma nas mãos.

No processo de montagem, ainda criamos a figura de um poeta boêmio pra homenagear a beleza do choro: "O meu choro desaguou numa roda de choro, fiz do samba meu coro, nas cordas do batuque, na batida do violão, toca meu consolo, minha canção".

Produzido pela Companhia Bueiro Aberto em co-produção com a Barreto Filmes, a película foi feita sem recursos e de forma totalmente independente. Teve sua estreia na própria casa de Luis Macambira e agora será exibido no Espaço Garrincha,

DATA: 25/07, Sábado
HORÁRIO: 19 hrs.
LOCAL: Espaço Cultural Mané Garrincha
ENDEREÇO: Rua Silveira Martins, 131, sala 11, Sé (próxima à saída pelo poupatempo do metrô Sé)






ROTEIRO E DIREÇÃO: Daniel Neves
PRODUÇÃO: Diogo Fonseca
DIREÇÃO DE FOTOGRAFIA: Jimmy Andrade
MONTAGEM: Daniel Neves
EDIÇÃO: Ton Neves

ANO DE PRODUÇÃO: 2015
DURAÇÃO: 32 minutos

TEXTO ESCRITO PELO DIRETOR DANIEL NEVES